Antes de iniciar propriamente esta coluna, preciso fazer ao leitor uma confissão: não vou a uma igreja há mais tempo do que eu gostaria. Parte de minha ausência da casa do Pai se dá pela união da necessidade e de minhas escolhas profissionais. Sou estudante de jornalismo na UFG e fiz parte, até pouquíssimo tempo atrás, do projeto de extensão Doutores da Bola (o projeto continua, e eu convido o leitor a ouvir nossas transmissões esportivas no YouTube). Além disso, para complementar minha renda, também trabalho em um bar. Sendo assim, os fins de semana, quando ocorrem a maioria das celebrações, estão extremamente ocupados.
Com isso posto, não deve ser difícil entender que acompanhei pouco as mensagens de Francisco à Igreja. Porém, não pude deixar de me emocionar e me admirar com a comoção causada pela partida do Sumo Pontífice. Francisco foi exemplo em vários aspectos, desde sua ordenação em 1969. Começando pela ordem da qual fazia parte: a Companhia de Jesus, ou, como é mais conhecida popularmente, os jesuítas. Esta congregação tem como uma de suas crenças o desprezo aos bens terrenos e o trabalho missionário e educacional.
Ao ser alçado a bispo em Buenos Aires, passou a viver em um quarto pequeno e humilde na Catedral Metropolitana da capital portenha — primeiro como bispo auxiliar, depois como bispo titular, arcebispo e, em 2001, como cardeal (ou seja, a partir daí, podendo ser votado como papa). Aparentemente, essas aspirações não entraram na cabeça do até então cardeal Bergoglio, que era famoso por usar apenas o transporte público e preparar a própria comida.

Em 2013, ao chegar ao posto mais alto da Igreja Católica, surpreendeu já no primeiro ato. Não apareceu luxuosamente paramentado como seus antecessores. Dias depois, a Santa Sé anunciou que o Papa Francisco não moraria na luxuosa Basílica de São Pedro, mas na Casa Santa Marta, local onde vivem os empregados do Vaticano e que hospeda membros do baixo clero em visitas à sede da Igreja. Além disso, comia no refeitório comum do local e tinha um quarto sem nenhuma diferença em relação aos outros.
Outro diferencial de Francisco em relação a seus antecessores foi a relação com seu rebanho. Bento XVI (que Deus o guarde em bom lugar) era um aristocrata, tinha imenso conhecimento teológico e filosófico, mas não tinha o carisma e a aproximação dos fiéis que Francisco trouxe para a Igreja. Bento parecia alguém inacessível, que você não imagina conversando sobre futebol ou outras trivialidades.
A imagem de Francisco era de alguém acessível para se falar não só da palavra de Deus, como seus antecessores fizeram, mas que também se preocupava com os temas deste plano. Um exemplo dessa preocupação com o secular é a carta apostólica Laudato si’, na qual ele critica fortemente o consumismo irresponsável e pede aos membros da Igreja que estejam atentos à destruição ambiental que nos rodeia e é causada por nós mesmos.
Esta encíclica acabou gerando ódio em quem não acredita que passamos pelas piores mudanças climáticas da história do nosso planeta, fazendo com que Francisco fosse chamado por muitos — que não aprovavam essa preocupação da Igreja — de herege e comunista.
Ainda nesse caminho de acolher, ser mais próximo de seu rebanho e causar ódio nos falsos fiéis, Francisco pediu perdão. E a Igreja tinha muitos motivos para isso. Mesmo deixando de ser conivente e endurecendo as regras contra o abuso infantil, Francisco pediu perdão às vítimas desses terríveis crimes. Mesmo tendo apenas acolhido a comunidade LGBTQIAP+, ele pediu perdão pelo tratamento desumano que a Igreja lhes deu anteriormente.
Como um grande corajoso, esteve à frente da Igreja durante talvez o pior momento mundial do século XXI: a pandemia de COVID-19. Enquanto a OMS e os mais sábios, como Francisco, pediam isolamento social para cortar a cadeia infecciosa, líderes inconsequentes insistiam em levar a vida normalmente. E Francisco? Produziu, de maneira não intencional, a maior imagem de fé do nosso tempo: rezou sozinho na imensa Praça São Pedro e deu a bênção Urbi et Orbi, que normalmente só é proferida em três momentos — no Natal, na Páscoa e na apresentação de um novo Sumo Pontífice.

Infelizmente, este ano não foi um bom ano para o pontificado de Francisco. Ele passou a maior parte do tempo internado por problemas respiratórios que o acompanhavam desde a juventude (Jorge Bergoglio vivia com praticamente um pulmão e meio desde então). Em seu último dia neste plano, quis receber novamente o calor e o carinho do público após a bênção Urbi et Orbi da Páscoa. E, após essa última interação, ele nos deixou.
Encerro lembrando do primeiro pedido do Papa Francisco: “Orem por mim“. Oremos pela alma deste papa que, acima de tudo, foi corajoso.