A prisão da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) em Roma, na Itália, marca um novo capítulo de um dos casos mais polêmicos do cenário político brasileiro recente.
Foragida por dois meses, a parlamentar foi localizada e detida na capital italiana nesta terça-feira (29), após deixar o Brasil para tentar escapar de uma condenação de 10 anos de prisão determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Crime de Zambelli
Zambelli responde pela invasão do sistema eletrônico do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ocorrida em 2023. Segundo as investigações, ela teria sido a mandante da ação, executada pelo hacker Walter Delgatti, também condenado. A parlamentar, que possui dupla cidadania, viajou à Itália alegando perseguição política e solicitando asilo, mas o governo brasileiro formalizou em junho um pedido de extradição com base em acordos internacionais.
A decisão final, no entanto, está nas mãos da Justiça italiana. O processo pode se arrastar por meses, devido aos trâmites legais e diplomáticos envolvidos. O Brasil já assegurou que, caso a extradição seja aprovada, Zambelli não será submetida a prisão perpétua, tortura, tratamento degradante ou julgamento por fatos anteriores ao pedido.
Enquanto isso, no Congresso, a situação política da deputada também se complica. Ela tirou 127 dias de licença não remunerada da Câmara dos Deputados, mas caso não retorne ao cargo após esse período, poderá ter o mandato cassado por faltas. Paralelamente, já é alvo de outro processo de cassação na Casa.
A defesa de Zambelli afirmou que ela se entregou voluntariamente às autoridades italianas, mas a Polícia Federal e autoridades locais sustentam que a prisão ocorreu após denúncia do deputado italiano Angelo Bonelli, que indicou seu paradeiro em Roma. O caso lembra o do ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, extraditado da Itália ao Brasil em 2015 após ser condenado no processo do mensalão.
Caso Cesare Battisti
Um fator que pode pesar no que diz respeito a uma possível recusa no processo de extradição da deputada tem a ver com o emblemático episódio de Cesare Battisti.
Condenado à prisão perpétua na Itália por terrorismo, o ex-militante de extrema esquerda Cesare Battisti foi protagonista de uma das mais longas e controversas disputas diplomáticas entre Brasil e Itália. Acusado de envolvimento em quatro homicídios nos anos 1970 — período conhecido como “Anos de Chumbo” na Itália, marcado por violentos confrontos ideológicos — Battisti passou mais de três décadas foragido.
Filho de comunistas, Battisti ingressou ainda jovem no Partido Comunista Italiano. No auge das tensões entre grupos de esquerda e de direita, organizações armadas como as Brigadas Vermelhas promoveram atentados, sequestros e assassinatos, como o do ex-primeiro-ministro Aldo Moro, em 1978. No ano seguinte, Battisti foi preso sob suspeita de envolvimento na morte de um joalheiro em Milão — crime em que o filho da vítima ficou paraplégico.
Após escapar da prisão, Battisti viveu na França, no México e retornou à França em 1990. Lá, beneficiou-se da chamada “Doutrina Mitterrand”, que protegia ativistas de esquerda de extradição. Com a mudança no governo francês e a reversão dessa política, ele fugiu para o Brasil.
Detido em 2007 no Rio de Janeiro, Battisti teve o status de refugiado político concedido pelo então ministro da Justiça Tarso Genro. Em 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que caberia ao presidente da República decidir sobre sua extradição. Luiz Inácio Lula da Silva optou por mantê-lo no país.
No entanto, o cenário mudou anos depois. Após ser preso por tentar sair do Brasil com dinheiro não declarado, o STF autorizou nova extradição. Em 2018, o presidente Michel Temer assinou o decreto que autorizou a entrega de Battisti à Itália, encerrando uma disputa que percorreu diversas instâncias da Justiça brasileira e internacional, incluindo a Corte Europeia de Direitos Humanos. *Com Agência Brasil