O ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal sobre a trama golpista, abriu nesta terça-feira (2) o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) com um discurso contundente contra a tentativa de ruptura democrática articulada no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O julgamento começou pela manhã e deve se estender até 12 de setembro, quando ocorrerá a última sessão do caso. Logo na abertura, Moraes rebateu críticas de aliados do ex-presidente sobre a celeridade do processo. O ministro destacou que a ação seguiu o mesmo rito das 1.630 ações abertas em decorrência dos atos de 8 de janeiro de 2023.
Ao relembrar episódios de ameaça à democracia na história brasileira, Moraes lamentou a repetição de tentativas golpistas e afirmou que a impunidade fortalece riscos de novos ataques institucionais. Para ele, a pacificação nacional exige respeito à Constituição, aplicação das leis e fortalecimento das instituições, sem confundir justiça com “covardia do apaziguamento”.
O ministro frisou que o Supremo julga com imparcialidade, independentemente de pressões ou ameaças internas e externas. Sem citar nomes, ele criticou articulações do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos Estados Unidos em defesa da anistia ao pai. Moraes classificou como “covarde e traiçoeira” a tentativa de uma organização criminosa de submeter o STF ao crivo de outro Estado.
“O Brasil não negociará sua soberania”, declarou.
Em seguida, Moraes leu seu relatório, que consumiu 1h27 e detalhou pedidos da defesa e decisões tomadas desde a fase de inquérito até o momento do julgamento.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, assumiu a palavra logo depois, com direito a duas horas de fala. Ele acusou Bolsonaro e sete ex-auxiliares de tentativa de golpe de Estado, organização criminosa armada, atentado contra o Estado Democrático de Direito, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Apenas o deputado Alexandre Ramagem responde a parte das acusações, protegido por imunidade parlamentar.
Gonet descreveu reuniões ministeriais desde 2021, minutas golpistas discutidas no Palácio da Alvorada e o uso irregular de órgãos como PRF e Abin para sustentar o plano. Citou ainda o documento “Punhal Verde e Amarelo”, que previa operações em dezembro de 2022 e até o assassinato de adversários como Lula, Alckmin e o próprio Moraes. O procurador ressaltou que a tentativa só fracassou porque comandantes das Forças Armadas rejeitaram aderir ao plano.
Para Gonet, os ataques de 8 de janeiro de 2023 encerraram o roteiro golpista, mas não nasceram de forma espontânea. Ele apontou que a organização criminosa financiou acampamentos e planejou protestos violentos, que resultaram na depredação das sedes dos Três Poderes.
“Não punir a intentona fortalece o autoritarismo e ameaça a vida civilizada”, afirmou.
Ele classificou como “atos espantosos e tenebrosos” os episódios de violência que marcaram a transição de governo, como o ataque à sede da Polícia Federal e a bomba no aeroporto de Brasília.
A defesa de Bolsonaro e dos outros réus nega participação em qualquer plano golpista, alega falta de provas e acusa o PGR de politizar reuniões e documentos de rotina. Os advogados também criticam a rapidez da tramitação e o volume de informações anexadas ao processo.
Caso sejam condenados, Bolsonaro e os sete ex-auxiliares podem pegar mais de 40 anos de prisão. O julgamento ocorre na Primeira Turma do STF, em Brasília, e é transmitido ao vivo pelos canais oficiais da Corte.
Quem são os réus?
O chamado Núcleo 1 da trama inclui oito pessoas:
- Jair Bolsonaro, ex-presidente
- Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil
- Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa
- Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional
- Almir Garnier, ex-comandante da Marinha
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça
- Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN)
- Mauro Cid, ex-ajudante de ordens
O julgamento está sendo conduzido pela Primeira Turma do STF, composta pelos ministros Alexandre de Moraes (relator), Cármen Lúcia, Luiz Fux, Flávio Dino e Cristiano Zanin (presidente). Na parte da tarde do julgamento, as defesas farão suas sustentações orais.