O Marco Civil da Internet, sancionado pela então presidente Dilma Rousseff em 2014, garantiu pela primeira vez direitos e deveres claros para usuários e provedores no Brasil. O texto oficial, Lei nº 12.965/2014, reconheceu a internet como direito de todo cidadão e estabeleceu que nenhuma empresa ou conteúdo poderia receber privilégios na circulação de dados.
Também determinou a inviolabilidade e o sigilo das comunicações online, permitindo o acesso a registros apenas mediante ordem judicial. Provedores passaram a guardar dados de conexão por um ano, com possibilidade de ampliação sob solicitação do Ministério Público ou da polícia.
Na época, as redes sociais ainda tinham pouco alcance, e os smartphones não eram tão populares, o cenário mudou radicalmente desde então: hoje, algoritmos definem o que bilhões de pessoas veem, e a disseminação de fake news, deep fakes e discursos de ódio desafia a segurança e a democracia.
O Supremo Tribunal Federal já alterou parte do Marco Civil, em junho, ministros decidiram responsabilizar redes sociais por conteúdos criminosos, obrigando plataformas a agir de forma proativa em casos de racismo, pedofilia, incitação à violência ou tentativa de golpe. Agora, notificações extrajudiciais podem obrigar empresas a remover conteúdos antes mesmo de decisão judicial.
O debate ganhou urgência com a exposição de casos envolvendo abusos contra menores, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou que enviará ao Congresso um projeto para regulamentar redes sociais voltadas a crianças e adolescentes. A proposta prevê exigência de verificação de idade, proibição de anúncios direcionados e “caixas de recompensa” em jogos, além de ferramentas de controle parental. Plataformas também terão de remover imediatamente qualquer conteúdo de abuso infantil ao serem notificadas.
O Senado aprovou parte dessas medidas em 2024, mas o texto travou na Comissão de Comunicação da Câmara, o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), já afirmou que quer levar o tema direto ao plenário. Porém, lideranças bolsonaristas da oposição, porém, articulam obstrução. Segundo os deputados ligados ao ex-presidente, o argumento é que o texto favorece o risco de “censura”, um discurso que, na prática, adia regras capazes de proteger crianças e responsabilizar big techs que lucram com a circulação de material nocivo.
O governo também prepara um outro projeto para punir empresas de tecnologia que hospedem ou impulsionem conteúdos criminosos. A proposta atinge anúncios pagos, redes de robôs e outros mecanismos artificiais de distribuição, fechando brechas exploradas por quem propaga crimes digitais.
Onze anos após sua criação, o Marco Civil continua referência internacional, mas enfrenta resistência de setores da direita alinhadas favorecimento de big techs. Enquanto isso, crianças e adolescentes seguem expostos a riscos que a legislação, no formato atual, não consegue eliminar.