Reportagem publicada pelo portal UOL neste domingo, 19, aponta indícios de desvio de recursos públicos destinados ao Jockey Club de São Paulo por meio da Lei Rouanet.
O esquema investigado envolve empresas e pessoas ligadas ao ex-governador de Goiás e atual presidente nacional do PSDB, Marconi Perillo, que é sócio do clube paulistano desde 2019 e conselheiro desde 2022.
O Jockey, que enfrenta grave crise financeira e acumula dívidas milionárias, recebeu R$ 83,6 milhões em incentivos fiscais nos últimos sete anos para restaurar sua sede centenária às margens do Rio Pinheiros, na zona oeste da capital paulista.
Desse total, R$ 22,4 milhões saíram da Lei Rouanet. Documentos obtidos pelo UOL mostram que parte dos recursos foi direcionada a empresas de fachada, serviços não comprovados e despesas que não têm relação com o projeto de restauro aprovado pelo Ministério da Cultura (MinC).
Segundo o portal, as notas fiscais apresentadas pelo Jockey incluem pagamentos a uma construtora de Goiânia que só existe no Instagram, jantares com vinhos em restaurantes de luxo, despesas pessoais em farmácias e diárias de hotel no Rio de Janeiro.
Também aparece o aluguel de um gerador de energia enviado para Santo Antônio de Goiás, sem qualquer justificativa técnica ligada às obras do clube em São Paulo, apurou o UOL.
Essa despesa foi registrada em nome da empresa Sapé Administração de Imóveis, que tem como sócia uma prima de Marconi Perillo e funciona no mesmo endereço da produtora cultural Elysium, em Goiânia.
A Elysium é peça central da investigação, mostra o UOL. A empresa foi transformada em Organização Social de Cultura (OSC) em 2014, por decreto do então governador Marconi Perillo, e passou a administrar projetos culturais financiados com dinheiro público em Goiás.
Em 2025, a produtora atingiu seu auge ao obter quatro aprovações simultâneas pela Lei Rouanet, todas ligadas ao Jockey Club. De acordo com a reportagem, Marconi teria indicado a empresa para coordenar o projeto de restauro e selecionar fornecedores, muitos deles também de Goiás e com vínculos familiares.
A Elysium pertence a João Carlos Unes, que atuava como assessor informal de Perillo no governo de Goiás, além de Wolney Alfredo e Sebastião Unes, tios e avô de Débora Perillo, a prima do ex-governador.
Apesar disso, Marconi Perillo nega conhecer a empresa e afirma não ter qualquer relação com as contratações.
Outra empresa envolvida é a Construtora Biapó, que confirmou ter prestado serviços ao Jockey, mas não informou valores recebidos. O fundador da Biapó é sócio dos irmãos Unes em outro CNPJ, a Biapó Urbanismo.
A reportagem identificou ainda duplicidade na documentação apresentada pelo Jockey. Notas fiscais foram usadas ao mesmo tempo para justificar despesas da Lei Rouanet e de outro programa de incentivo, o TDC (Transferência do Direito de Construir), da Prefeitura de São Paulo, que destinou mais R$ 61,2 milhões ao clube.
O Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) rejeitou as contas do Jockey e concluiu que os documentos são insuficientes e podem indicar que parte dos recursos públicos foi utilizada para pagamento de dívidas, o que é ilegal.
O caso é investigado por uma força-tarefa formada pelo Ministério da Cultura e pela Controladoria-Geral do Município de São Paulo.
Especialistas ouvidos pelo UOL afirmam que as irregularidades podem resultar na devolução integral do dinheiro público e responsabilização dos envolvidos por improbidade administrativa, estelionato e lavagem de dinheiro.
Procurado pelo UOL, o presidente do Jockey, Marcelo Motta, afirmou que “devido ao caráter privado da entidade, a escolha de fornecedores é uma decisão interna”.
A Elysium negou ter atuado com recursos do TDC e afirmou que todos os gastos obedecem à legislação cultural.
Marconi Perillo declarou que “qualquer tentativa de associar seu nome ao caso é uma leviandade absurda” e garantiu não ter participado de indicações ou contratos.
Marconi mudou-se para São Paulo após perder a eleição para o Senado em 2018 e passou a atuar como consultor. Sua empresa prestou serviços à Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), do empresário Benjamin Steinbruch, então presidente do Jockey Club.
Desde então, Perillo tem ampliado sua influência nos bastidores do hipódromo, articulando com vereadores e com a prefeitura uma tentativa de reduzir ou perdoar dívidas do clube com IPTU e ISS, que somam mais de R$ 800 milhões — sem sucesso até agora.
Abaixo, a reportagem do UOL:
Como verba milionária da Rouanet para Jockei de SP foi parar em Goiás