As “terras raras” são 17 elementos metálicos — os 15 lantanídeos, mais ítrio e, em algumas classificações, escândio — conhecidos por suas propriedades magnéticas, luminescentes e catalíticas. Apesar do nome, não são raros na crosta terrestre. O que falta são jazidas com concentração suficiente e tecnologia de separação que permitam produção em escala e custo competitivo.
Eles estão presentes em imãs permanentes de alto desempenho (NdFeB), motores de veículos elétricos, turbinas eólicas, smartphones, sensores, catalisadores e até aplicações militares, como guiagem de mísseis e sistemas de comunicação.
Quem domina o mercado
Hoje, a China lidera toda a cadeia: cerca de 70% da mineração global, 90% do refino químico e mais de 90% da fabricação de imãs com terras raras, segundo levantamento do Financial Times. Essa vantagem vem de décadas de política industrial, integração vertical e custos mais baixos, somados a controles sobre exportação de tecnologia. Desde 2023, Pequim limita a saída de know-how sobre extração, separação e produção de imãs.
A Agência Internacional de Energia (IEA) aponta que a demanda por minerais críticos cresce com a transição energética, e o refino continua concentrado em poucos países. No caso das terras raras, a expansão recente vem quase toda da China. Com imãs de NdPr, Dy e Tb essenciais para motores de EVs e turbinas eólicas, a pressão de demanda deve continuar nas próximas décadas.
O Brasil no mapa das terras raras
O Brasil aparece como país com grande potencial de diversificação. Dados do Serviço Geológico do Brasil (SGB/CPRM) indicam que o país tem a segunda maior reserva mundial, cerca de 21 milhões de toneladas de óxidos, atrás apenas da China.
As jazidas mais importantes ficam em Minas Gerais (Araxá), Goiás, Amazonas e Bahia, muitas vezes associadas a nióbio, fosfato e monazita. Projetos de pesquisa e exploração foram retomados recentemente, incluindo ações da Indústrias Nucleares do Brasil (INB) e parcerias privadas. Em 2024, o governo classificou terras raras como minerais estratégicos, priorizando investimentos, mineração sustentável e cooperação internacional para refino e industrialização.
O desafio é transformar potencial geológico em cadeia produtiva completa. Hoje, parte dos concentrados é exportada sem agregar valor, e o processamento ainda depende do exterior. A pressão internacional — de EUA e União Europeia — reforça a necessidade de acelerar refino interno, equilibrando economia e preservação ambiental, já que a separação química gera resíduos radioativos.
Onde os EUA entram
Nos Estados Unidos, a única operação de grande escala fica em Mountain Pass, Califórnia, da MP Materials. Em 2024, a mina produziu cerca de 45 mil toneladas de concentrado e avançou na separação de óxido de NdPr. Ainda assim, o país depende de refino e fabricação de imãs fora de casa. Dados do USGS indicam produção doméstica de 45 mil toneladas e importações de US$ 170 milhões, mostrando fragilidade diante da demanda interna.
Por isso, o governo Trump colocou terras raras no centro da agenda de segurança econômica. Em março de 2025, anunciou medidas para acelerar produção doméstica e reduzir dependência de “potências hostis”, com decretos que priorizam novos projetos.
O que mudou em 2025
O Departamento de Defesa firmou parceria multibilionária com a MP Materials para expandir separação e fabricar imãs nos EUA, usando o Defense Production Act e instrumentos financeiros estratégicos. A meta é criar rota completa “mina-imã” e garantir compras públicas, atraindo investimentos domésticos.
Externamente, Trump quer recorrer à ilegalidade, segundo um tribunal estadunidense. Diante de sinais de restrições chinesas a exportações e tecnologia, ameaçou tarifas de 200% caso Pequim “apertasse o torniquete”.
Analistas veem a disputa como equilíbrio de interdependência: EUA precisam de imãs e terras raras, China depende de semicondutores ocidentais. O “circuit breaker” reduz risco de corte total imediato, mas mantém o tema como alavanca geopolítica.
Por que o interesse de Trump
A motivação é clara: segurança nacional, competitividade tecnológica e poder de barganha. Terras raras são vitais em aplicações militares; depender de um único fornecedor é risco estratégico.
Veículos elétricos, turbinas e eletrônica avançada exigem imãs estáveis; sem eles, os EUA perdem empregos qualificados e capacidade industrial. Ao fortalecer a base doméstica, o governo ganha mais margem em negociações comerciais e tecnológicas.
O que esperar
Especialistas lembram: criar cadeia completa fora da China leva anos e exige investimento alto. Mesmo com Mountain Pass ampliando produção, romper a dependência do refino asiático é tarefa de médio prazo. No mercado, qualquer ajuste na China — suspensão de embarques ou mudança de cotas — impacta preços de NdPr, o “coração” dos imãs de alto rendimento.
Em resumo: terras raras não são apenas “mais um minério”. São a engrenagem invisível de tecnologias civis e militares. A aposta de Trump em produção e manufatura domésticas busca blindar cadeias críticas. O sucesso dependerá de financiamento contínuo, política industrial consistente e tempo para escalar minas, separação química e fábricas de imãs — tudo ainda sob a sombra da liderança chinesa.