Para o viajante comum, são apenas três letras impressas no cartão de embarque ou na etiqueta colada à mala: GYN, CFN, GRU. Porém, essas combinações não são aleatórias. Elas são o resultado de um complexo sistema de padronização internacional que remonta aos primórdios da aviação comercial e envolve geografia, história e, por vezes, heranças militares.
Para entender essa “sopa de letrinhas”, é preciso distinguir as duas principais autoridades globais que regem essas nomenclaturas: a IATA (Associação Internacional de Transportes Aéreos) e a ICAO (Organização da Aviação Civil Internacional).
O Código IATA
O código de três letras, aquele com o qual o público interage, é gerido pela IATA, que está sediada em Montreal, no Canadá. A função dessa Associação é puramente comercial e logística: facilitar a reserva de passagens, o despacho de bagagens e a comunicação entre as companhias aéreas.
A lógica de atribuição segue, preferencialmente, o nome da cidade ou do aeroporto, mas a história muitas vezes interfere:
O método mais comum é abreviando ao utilizar as primeiras letras da cidade.
Exemplos
- MAD: Madri
- LIS: Lisboa
- MIA: Miami
- BSB: Brasília
- CNF: Confins
- GYN: Goiânia
Agora, quando uma cidade possui mais de um terminal, o código passa a fazer referência ao nome específico do aeroporto ou sua localização geográfica.
- GRU: Aeroporto de Guarulhos (São Paulo).
- CGH: Aeroporto de Congonhas (São Paulo).
- LHR: London Heathrow (Londres).
- LGW: London Gatwick (Londres).
E quando a vontade de nome que impera vem de uma herança histórica? Muitos códigos parecem não fazer sentido hoje porque mantiveram nomes antigos ou origens militares.
- ORD (Chicago O’Hare): Antes de ser renomeado em homenagem ao aviador Edward O’Hare, o local chamava-se Orchard Field. O código ORD permaneceu.
- MCO (Orlando): Antes de ser o destino da Disney, era a McCoy Air Force Base.
- GIG (Rio de Janeiro): Refere-se à Galeão – Ilha do Governador, nome original do local antes de ser batizado como Tom Jobim.
O Código ICAO
Enquanto o passageiro lida com a IATA, os pilotos e controladores de tráfego aéreo utilizam um sistema diferente, de quatro letras, gerido pela ICAO, uma agência da ONU. Este sistema já tem o foco no planejamento de voo e na geolocalização precisa.
A lógica da ICAO é estritamente geográfica e hierárquica, eliminando qualquer ambiguidade:
- 1ª Letra: Indica a região do continente ou grande área geográfica.
- 2ª Letra: Indica o país dentro daquela região.
- 3ª e 4ª Letras: Identificam o aeroporto específico.
O Caso do Brasil (Prefixo SB): A América do Sul é designada pela letra S. O Brasil, pela letra B. Portanto, a maioria dos grandes aeroportos brasileiros começa com SB:
- SBGR: Guarulhos (GRU)
- SBRJ: Santos Dumont (SDU)
- SBGL: Galeão (GIG)
- SBGO: Santa Genoveva (GYN)
- SBCF: Confins (CNF)
Um detalhe é que nem todos os aeródromos no Brasil começam com SB. Aeródromos menores ou privados podem ter prefixos como SD, SN, SS ou SW, dependendo da classificação da estação de rádio e homologação da ANAC, mas todos seguem a lógica regional da ICAO.
O mistério do “Y” canadense e do “K” estadunidense
Existem também exceções à regra das abreviações de cidades, baseadas em legados de radiodifusão e meteorologia da década de 1930.
- Canadá (Y): Se você viajar para Vancouver, o código é YVR. Toronto é YYZ. Historicamente, o Canadá usava o prefixo “Y” (de Yes) para indicar que uma estação meteorológica estava co-localizada com um aeroporto. A prática pegou e se tornou o padrão IATA do país.
- EUA (K): Nos Estados Unidos, a ICAO manteve os códigos de rádio locais. O prefixo continental dos EUA é K. Portanto, o código IATA de Nova York (JFK) torna-se KJFK para os pilotos.
Por que isso importa?
A padronização não é apenas burocracia; é questão de segurança. Com dezenas de milhares de aeroportos no mundo, nomes similares podem causar grandes problemas.
Imagine só: o aeroporto de Birmingham no Reino Unido (BHX) e o aeroporto de Birmingham no Alabama, EUA (BHM). Sem os códigos únicos e rastreáveis, uma mala — ou pior, um avião cheio de passageiros — poderia ser enviado para o continente errado. As “letrinhas”, então, são as coordenadas vitais que mantêm a malha aérea global conectada e livre de erros.








