A condenação de Jesus e o questionamento da legitimidade da participação popular

Compartilhe

Ecce Homo, Caravaggio (1571-1610) – Divulgação Wikimedia

Agora na Semana Santa as redes sociais exibiram de forma bastante ampla, como faz todos os anos, episódios envolvendo a vida pública, o julgamento, as ofensas físicas e morais proferidas contra Jesus, assim como o seu martírio, que resultou em sua morte, diante da manifestação embravecida da multidão presente, gritando e exigindo a sua condenação e a absolvição do bandido Barrabás. Da mesma forma as igrejas cristãs, notadamente a católica, que nessa época volta todas as suas atenções para a mesma realidade, nas celebrações da quaresma.

Quaresma é tempo de refletir sobre as dores e a paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo. Na Sexta-feira Santa (ou Sexta-feira da Paixão), a Igreja relembra o dia em que Jesus Cristo foi crucificado. Acusado de malfeitor, Jesus foi preso e martirizado; recebeu uma coroa de espinhos na cabeça; foi levado à presença de Pilatos, quando foi julgado de condenado. Foi obrigado a carregar uma cruz de madeira até o monte Calvário, para a própria crucificação; ao meio dia foi crucificado entre dois ladrões e, por volta das três da tarde, Jesus morreu. Seu corpo foi retirado da cruz e colocado num sepulcro cavado na rocha.
Alguns desses fatos se destacam, como por exemplo o que motivou a acusação e o próprio comportamento do povo ali presente, com papel fundamental na formação da culpa e na negociação para a execução da pena, assim como o posicionamento de Pilatos, governante e juiz, responsável direto pela análise das provas, pelo julgamento e pela condenação do réu.

Jesus foi acusado de malfeitor, que significa facínora, perverso, aquele que comete crimes e pratica o mal ou é detentor de ações deploráveis. Como se vê, Jesus não era nada disso. Tratava-se, portanto, de acusações infundadas. Todos sabiam dos seus propósitos, inclusive Pilatos que, não só reconheceu a sua inocência, como também queria soltá-lo: “Eu não encontro nenhuma culpa nele” (Jo 18,38). Mas os acusadores insistiam, aos gritos, inclusive com ameaças graves contra o julgador: “Se soltares, não é amigo do imperador, porque todo o que se faz rei se declara contra o imperador” (Jo 19,12).

Diante disso, Pilatos agarrou-se a uma solução, que para ele era honrosa, e propôs aos manifestantes: “Mas é costume entre vós que pela Páscoa vos solte um preso. Quereis, pois, que vos solte o rei dos judeus?”. Então todos gritaram novamente e disseram: “Não! A este não! Mas a Barrabás” (Jo 18,39-40).

Ecce homo, Antonio Ciseri (1821-1891) – Divulgação Wikimedia

Como se depara, foi o povo, em manifestação pública, que definiu pela culpa e pela prisão e morte de Jesus. Pode-se dizer, em palavras mais contundentes, que foi o povo que matou Jesus, sem querer, como isso, isentar Pilatos, que detinha nas mãos o poder de soltá-lo, mas se acovardou. Contudo, a pergunta que não deve ficar sem resposta é a seguinte: O que havia mesmo por trás desse posicionamento do povo? Quem foi o patrocinador dessa participação popular? O que essas pessoas ganharam para aderir a esse ato sujo e ignóbil?

O certo é que o fato narrado remonta há mais de dois mil anos. E a história revela que Jesus foi vítima de processo escuso, montado para servir interesses dos poderosos da época, com o objetivo específico de pôr fim às ameaças de alguém que recriminava o erro e praticava somente o bem; não só pregava o bem, em detrimento do mal, como também apontava o perdão e o amor recíproco como o caminho único para a paz, para a convivência harmoniosa do ser humano e para a conquista da vida eterna.

Apesar de tudo o que foi ensinado pelo Mestre, hodiernamente se observa que as estratégias utilizadas tanto pelos militantes na área privada quanto os detentores do poder, incluindo-se aqui parte expressiva dos componentes do poder político, observadas as exceções encontradas, conservam grande semelhança e características das colocadas em execução naquela época do julgamento de Jesus, há mais de dois milênios.

E aí cabe a pergunta: O que aconteceu nesse interregno, o homem não evoluiu? Continua com os mesmos ranços pecaminosos e os mesmos ideais criminosos do passado? Nesse sentido, é do conhecimento geral que no meio político, o candidato, para se eleger, precisa do voto do eleitor, evidentemente. Mas nem sempre esse voto vem de graça ou em nome do exercício da cidadania. Tem um preço, no varejo ou no atacado, isto é, o voto próprio ou de toda a família. Muitas vezes, quando o candidato não chega distribuindo propina, à cata do precioso voto, o eleitor já o apresenta carimbado ao político. E se não pagar o preço da fatura não tem voto. E sempre há quem ofereça melhor lance no leilão.

Nas manifestações públicas, em defesa do bem, dito por coletivo, não é muito diferente. O povo comparece e exerce o seu papel de propagador e defensor dos ideais propostos. Porém nem sempre tais acontecimentos e adesões apresentam o timbre da legitimidade e dos princípios morais e éticos. Algumas das indagações é saber o que está por trás de todo o movimento e quem é que está bancando essas apresentações. O povo pode estar movido pelo patriotismo ou pela defesa da classe, do partido político, dos governantes ou mesmo da oposição. Pode ser também que haja uma camuflagem ou ainda o reflexo da propina, da corrupção e da indecência moral. Há sempre uma dúvida: O que de fato alavanca as manifestações populares para garantir a sua legitimidade?

De qualquer forma, ressoa até hoje e por certo continuará ecoando até o fim dos tempos a expressão pronunciada por Jesus, momentos antes de sua morte: “Pai, perdoa-lhes; porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34).

Recentes
Coronel Urzêda propõe proibir uso de serviço público para cuidados com bebês reborn
Coronel Urzêda propõe proibir uso de serviço público para cuidados com bebês reborn
Política · 2h
Gaucho and the Grassland: game inspirado na cultura gaúcha chega em julho ao PC
Gaucho and the Grassland: game inspirado na cultura gaúcha chega em julho ao PC
Variedades · 3h
Chronoworking propõe jornada de trabalho alinhada ao relógio biológico
Chronoworking propõe jornada de trabalho alinhada ao relógio biológico
Variedades · 3h
Maioria dos internados com influenza no HMAP não tomou vacina
Maioria dos internados com influenza no HMAP não tomou vacina
Saúde · 4h
Mais do PortalGO
Foto: Catarina Cardoso/MPA
Senado aprova projeto que garante acesso livre a praias, rios e cachoeiras públicas
Comissão do Senado aprova projeto que garante livre acesso a praias, rios e cachoeiras públicas. Proposta agora será analisada na Câmara dos Deputados. 20 maio 2025 · Brasil
Foto: Reprodução
Eduardo Costa aparece careca em show e revela motivo: “muita bomba”
Eduardo Costa surpreende ao aparecer careca em show e revela que queda de cabelo foi causada por anabolizantes. 20 maio 2025 · Variedades
Foto: Divulgação
Quase 1.200 vagas de emprego estão abertas em Aparecida de Goiânia
Aparecida de Goiânia oferece 1.194 vagas de emprego nesta semana por meio do Sistema Municipal de Emprego (SIME). 20 maio 2025 · Trabalho
Fotos: Mantovani Fernandes/Seel
Parque Aquático de Goiânia passa por reforma após mais de 10 anos sem competições oficiais
Após anos sem uso, Parque Aquático de Goiânia passa por reforma para voltar a sediar competições oficiais. 20 maio 2025 · Goiás
Processo Seletivo para Reingresso, Transferência Interna, Transferência Externa e Portadores de Diploma (Foto: UEG)
UEG divulga edital do Minha Vaga 2025/2
UEG abre 5.374 vagas para Reingresso, Transferência e Portadores de Diploma em 32 cursos. Inscrições até 13/06. 20 maio 2025 · Educação
Consumidora solicitou, por meio do Procon Goiás, o ressarcimento dos valores pagos (Foto: Divulgação)
Procon multa Ultragaz em mais de R$ 32 mil por cobrança indevida
Procon Goiás multa Ultragaz em R$ 32,6 mil por cobrança abusiva de taxa de leitura de gás. Entenda o caso e seus direitos como consumidor. 19 maio 2025 · Economia
Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
General é advertido durante audiência de testemunhas da trama golpista
Alexandre de Moraes confronta Freire Gomes por inconsistências em depoimento sobre reunião que discutiu medidas para impedir posse de Lula. 19 maio 2025 · Justiça
Programa Caminhos da Reportagem destaca importância da preservação do Cerrado para o meio ambiente e os benefícios para a economia – Foto: Frame/TV Brasil
Cerrado: preservação e negócios são tema do Caminhos da Reportagem
Programa Caminhos da Reportagem mostra como a conservação do Cerrado movimenta economia com turismo, agropecuária sustentável e comunidades tradicionais. 19 maio 2025 · Meio Ambiente
Foto: Fellipe Sampaio /STF
Moraes abre audiência de depoimentos sobre trama golpista
STF ouve testemunhas do inquérito golpista, incluindo general Freire Gomes. Bolsonaro e outros 7 réus são acusados pela PGR. 19 maio 2025 · Justiça
Divulgação – CBF
Eleição na CBF: Samir Xaud registra chapa e pode ser candidato único
Samir Xaud, presidente da Federação Roraimense, é o único candidato à presidência da CBF, eleição ocorre dia 25/08. 19 maio 2025 · Esportes