Os presidentes Donald Trump e Xi Jinping selaram nesta quinta-feira (30) um acordo que reduz as tensões comerciais entre Estados Unidos e China, após meses de negociações. O entendimento foi fechado durante uma reunião em Seul, na Coreia do Sul, e marca um novo capítulo na disputa comercial entre as duas maiores economias do planeta.
Pelo acerto, os Estados Unidos diminuirão as tarifas médias sobre produtos chineses para 47%, cerca de dez pontos percentuais abaixo do patamar anterior. Em contrapartida, a China suspenderá por um ano as restrições à exportação de terras raras, retomará as compras de soja americana e se comprometeu a reforçar o combate ao tráfico de fentanil, substância que tem provocado uma grave crise de opioides no país norte-americano.
Trégua estratégica
O acordo encerra uma rodada de negociações sobre as sobretaxas aplicadas em abril e é visto por especialistas como um alívio temporário para o comércio internacional e as cadeias globais de suprimentos.
Um dos pontos centrais da trégua está nas chamadas “terras raras”, um conjunto de 17 metais usados em produtos tecnológicos, veículos elétricos, aeronaves e sistemas de defesa. Embora não sejam realmente raros, sua extração e refino são complexos — e a China domina a maior parte da produção mundial, o que lhe confere grande vantagem estratégica.
Em resposta às tarifas impostas por Trump, Pequim havia restringido recentemente a exportação desses elementos, afetando indústrias de vários países. Com a suspensão dessas restrições, empresas de alta tecnologia e setores industriais fora da China devem ganhar previsibilidade no fornecimento de insumos.
“As terras raras são agora o instrumento mais eficaz que a China pode acionar”, disse Zongyuan Zoe Liu, pesquisadora do Council on Foreign Relations. “O restante do mundo não tem capacidade produtiva disponível a custos viáveis.”
Chips e interdependência tecnológica
Outro ponto sensível entre os dois países é o mercado de chips e semicondutores. A Nvidia, gigante americana do setor, depende do mercado chinês para cerca de 25% de suas vendas globais, o que pressiona Washington e Pequim a manterem algum nível de cooperação.
“Há uma interdependência muito clara: os chineses precisam desses chips, e as empresas americanas não querem perder o mercado”, analisa José Roselino, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
A escassez global de chips já afeta diversos setores — montadoras como a Honda, no México, chegaram a interromper a produção — e o acordo entre EUA e China tende a aliviar parcialmente esse cenário.
Efeitos econômicos e políticos
Economistas avaliam que, sem o acordo, a disputa comercial poderia paralisar setores industriais, pressionar preços de commodities e frear o crescimento global. O entendimento, portanto, é visto como uma trégua política com reflexos econômicos imediatos, oferecendo mais estabilidade aos mercados e reduzindo incertezas.
Para os Estados Unidos, a retomada das compras chinesas de soja também tem peso político. O produto é uma das principais exportações americanas e uma base importante de apoio eleitoral a Trump. Segundo a Reuters, a China se comprometeu a comprar pelo menos 25 milhões de toneladas de soja por ano nos próximos três anos — o equivalente a 833 mil caminhões ou 350 navios graneleiros.
Impactos para o Brasil
A medida, porém, pode trazer efeitos mistos para o Brasil. De um lado, o país tende a se beneficiar com o alívio nas tensões globais e o fortalecimento das cadeias comerciais. De outro, a volta das compras chinesas de soja dos EUA pode reduzir a demanda pelo grão brasileiro e pressionar preços e volumes exportados.
No primeiro semestre de 2025, os portos brasileiros do Sul: Santos, Paranaguá, Rio Grande e São Francisco do Sul, responderam por 66% das exportações de soja à China. Em setembro, o país asiático aumentou em quase 30% as importações do produto brasileiro, atingindo 10,96 milhões de toneladas, ou 85% do total importado naquele mês.
“O interesse dos produtores americanos pesou muito nessa negociação”, explica Roselino. “Trump precisava dar uma resposta à sua base rural, e isso acabou abrindo espaço para o Brasil repensar sua estratégia comercial.”
Brasil no centro das negociações
A valorização das terras raras também recoloca o Brasil em evidência. O país possui a segunda maior reserva mundial desses minerais, mas ainda não domina o processamento em larga escala, exportando, na prática, matéria-prima bruta. Parte do material extraído em Serra Verde, em Goiás, segue diretamente ao exterior.
O tema foi abordado no encontro recente entre Lula e Trump, no último domingo (26), em Washington, o primeiro entre os dois líderes. Segundo o Itamaraty, o governo brasileiro pretende solicitar a suspensão das tarifas americanas sobre produtos nacionais durante o período de negociações bilaterais.
“Esperamos concluir em pouco tempo uma negociação que trate de todos os setores da atual tributação americana ao Brasil”, afirmou o chanceler Mauro Vieira, destacando que as conversas incluirão minerais críticos e terras raras.
Trump, por sua vez, elogiou Lula e disse que a reunião foi “muito boa”, mas ressaltou que “não há garantias de acordo imediato”.
Um alívio cauteloso
Com a trégua entre Estados Unidos e China, o comércio global tende a se estabilizar, beneficiando exportadores como o Brasil. Ainda assim, especialistas alertam que a concorrência internacional deve se acirrar, principalmente se os EUA se tornarem novamente o destino preferencial de parte das importações chinesas.
Para o Brasil, o desafio será diversificar seus parceiros e agregar valor às exportações, evitando depender excessivamente de commodities e aproveitando oportunidades abertas na nova configuração comercial.










