O Brasil acaba de endurecer os critérios para diagnóstico e tratamento da pressão alta. Uma nova diretriz, lançada nesta quinta-feira (18) no 80º Congresso Brasileiro de Cardiologia, reclassificou os valores de pressão arterial e estabeleceu metas mais rígidas para médicos e pacientes.
De acordo com o documento, pressões entre 120 e 139 mmHg (sistólica) e/ou 80 e 89 mmHg (diastólica), popularmente chamado de pressão 12 por 8, deixam de ser consideradas apenas “normais limítrofes” e passam a configurar pré-hipertensão. A mudança segue tendência internacional: em 2024, o Congresso Europeu de Cardiologia já havia adotado o termo “pressão elevada” para esses mesmos valores.
A diretriz foi elaborada pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), pela Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN) e pela Sociedade Brasileira de Hipertensão (SBH). O objetivo é ampliar a prevenção, incentivando alterações de estilo de vida e, em alguns casos, o início precoce do tratamento medicamentoso.
Outra alteração importante envolve a meta terapêutica. Antes, os especialistas aceitavam que manter a pressão abaixo de 140/90 mmHg (14 por 9) era suficiente. Agora, a recomendação é universal: todos os hipertensos devem buscar pressão abaixo de 130/80 mmHg (13 por 8). O novo parâmetro vale para jovens, idosos, mulheres, diabéticos, obesos e pessoas com doenças renais ou cardiovasculares.
Os especialistas justificam que a meta mais baixa reduz o risco de complicações como infarto, Acidente Vascular Cerebral (AVC) e insuficiência renal. Se o paciente não tolerar a queda, a orientação é atingir o menor nível possível dentro da segurança clínica.
A diretriz também inova ao considerar o risco cardiovascular global. O relatório incorporou o escore PREVENT, ferramenta que calcula a probabilidade de eventos em dez anos, analisando fatores como obesidade, diabetes, colesterol alto e lesões em órgãos-alvo. Essa abordagem aproxima o cuidado da chamada medicina de precisão, com condutas mais agressivas para quem tem alto risco.
Pela primeira vez, o documento traz um capítulo voltado ao Sistema Único de Saúde (SUS), onde está 75% dos pacientes hipertensos. A orientação aos profissionais da rede básica inclui priorizar fármacos disponíveis, adotar protocolos multiprofissionais e usar métodos de monitoramento como MAPA e MRPA, sempre que possível.
Outro avanço é a inclusão da saúde feminina. A diretriz dedica recomendações específicas para diferentes fases da vida:
- Anticoncepcionais: medir a pressão antes da prescrição e monitorar regularmente.
- Gestação: priorizar medicamentos seguros, como metildopa e alguns bloqueadores de canais de cálcio.
- Peri e pós-menopausa: intensificar o acompanhamento, já que a pressão tende a subir.
- Histórico gestacional: mulheres que tiveram hipertensão na gravidez devem receber acompanhamento de longo prazo.
As medidas tradicionais continuam indispensáveis: perda de peso, corte no sal, dieta rica em potássio, padrão DASH e prática regular de exercícios. Para a maioria, o início do tratamento deve combinar dois fármacos em baixas doses, preferencialmente em um único comprimido.
A hipertensão continua sendo um dos maiores desafios de saúde pública no país. Ela responde pela maior parte dos infartos e AVCs. Segundo a Sociedade Brasileira de Hipertensão, 27,9% dos adultos convivem com a doença, mas só um terço consegue mantê-la sob controle.
Com a reclassificação, os novos alvos e os capítulos inéditos sobre SUS e saúde da mulher, milhões de brasileiros entram para a zona de risco. O desafio, agora, é levar as recomendações do papel para a rotina, reduzindo desigualdades regionais e evitando milhares de mortes todos os anos.