A investigação que apura o monitoramento ilegal de autoridades pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) apontou o uso de ferramentas para espionar uma série de cidadãos, como deputados e pessoas ligadas à política, como investigadores. Segundo a PF, a Abin Paralela mirou jornalistas, servidores públicos, políticos, policiais, advogados e até juízes.
A quadrilha utilizava principalmente o monitoramento por meio de um software israelense chamado “First Mile”. O governo brasileiro comprou ilegalmente essa tecnologia, que usava GPS para rastrear irregularmente a localização de celulares.
Desafetos políticos de Bolsonaro
Os monitoramentos tinham como objetivo “caçar os podres” de desafetos de Bolsonaro. A PF aponta que a Abin produziu “dossiês” sobre:
- Alexandre de Moraes, ministro do STF
- Luís Roberto Barroso, presidente do STF
- Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara
- Joice Hasselmann, ex-deputada
- Deputado Kim Kataguiri (União-SP)
- Deputado Arthur Lira (PP-AL)
- Senador Renan Calheiros (MDB-AL)
- Senador Omar Aziz (PSD-AM)
- Senador Randolfe Rodrigues (PT-AP)
Segundo o inquérito, a Presidência da República solicitou os monitoramentos, o que comprova o viés político da ação clandestina.
Caso Marielle Franco
A Abin Paralela também monitorou as investigações sobre o homicídio da ex-vereadora Marielle Franco, ocorrido em 2018. Segundo a PF, quando a Polícia Civil do Rio de Janeiro trocou o delegado do caso, em 2020, Alexandre Ramagem, então diretor-geral, pediu um dossiê sobre o novo delegado, Daniel Freitas da Rosa, à equipe criminosa da Abin.
A equipe também monitorou Simone Sibilio, ex-coordenadora da força-tarefa do Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) que investigava as mortes de Marielle Franco e Anderson Gomes. Segundo a PF, o objetivo era antecipar eventuais acusações que ligassem o crime ao Núcleo Político da agência.
Monitoramento de personalidades civis
O ex-deputado Jean Wyllys e o humorista Gregório Duvivier também sofreram monitoramento a pedido do então presidente Jair Bolsonaro. As tentativas de vigiar Jean Wyllys começaram em 2019, nos primeiros meses do governo Bolsonaro.
A equipe da Abin não conseguiu efetivar o monitoramento porque Wyllys estava nos Estados Unidos, país onde o contrato de uso do First Mile proíbe operações, assim como em Israel. Sem conseguir rastrear Wyllys, a Abin passou a investigar seus familiares, como suas irmãs.
A equipe também monitorou Gregório Duvivier. Segundo as investigações, o governo o vigiou por conta de um programa que criticava a desinformação do governo Bolsonaro.
Jornalistas que investigavam a existência do gabinete paralelo também sofreram espionagem ilegal, como a jornalista Luiza Alves Bandeira. A Abin perseguiu Pedro Cesar por organizar atos “Fora Bolsonaro”.
Além disso, Vera Magalhães, Luiza Bandeira, Pedro Batista, Reinaldo Azevedo e Alice Martins de Costa Maciel também entraram na mira da Abin por serem considerados “jornalistas left”, ou seja, por fazerem trabalhos investigativos.
Barrar investigações contra Renan Bolsonaro
A Abin também atuou para frear investigações da Polícia Federal contra Jair Renan Bolsonaro, o quarto filho do ex-presidente. A agência tentou ainda “caçar podres” de Allan Gustavo Lucena do Norte, ex-sócio e personal trainer do “04”.
Os agentes da Abin iniciaram as vigilâncias, mas o ex-sócio desconfiou da movimentação, chamou a Polícia Militar, que deteve um dos agentes. O servidor da Abin fugiu para não ser levado à Polícia Civil.