Em 24 de junho de 1982, o voo British Airways 9, operado por um Boeing 747-236B conhecido como City of Edinburgh, enfrentou uma emergência aérea sem precedentes que entrou para a história da aviação.
Durante o trajeto de Kuala Lumpur a Perth, a aeronave impensadamente cruzou uma nuvem de cinzas vulcânicas lançada pela erupção do Monte Galunggung, na Indonésia, resultando na falha simultânea de todos os quatro motores a 37 mil pés de altitude.
Sem potência e com instrumentos cruciais comprometidos, a tripulação realizou um dos mais notáveis voos planados da história e um pouso de emergência em Jacarta, salvando as 263 vidas a bordo.
O Incidente
A falha dos motores ocorreu durante a noite. A tripulação observou um fenômeno visual impressionante, semelhante ao Fogo de Santelmo, envolvendo a fuselagem da aeronave, sem saber que estavam voando através de partículas de rocha vulcânica.
O capitão Eric Moody, com aproximadamente 18 anos de experiência na British Airways, foi informado por seu engenheiro de voo, Barry Townley-Freeman, que todos os motores haviam parado. Com uma calma que se tornaria lendária, Moody fez o seguinte anúncio aos passageiros:
“Senhoras e senhores, temos um pequeno problema: todos os quatro motores pararam. Estamos fazendo o nosso máximo para reiniciá-los. Espero que não estejam em grande aflição.”
A aeronave iniciou então uma descida controlada em direção a Jacarta, planando por cerca de 23 minutos. Diferente do que muitos pensam, se um avião perder os motores ele não vai despencar do céu sem controle: ele continua voando por ser aerodinamicamente planeável.
Durante o processo, ao sair da nuvem de cinzas e atingir uma altitude mais baixa, a tripulação conseguiu religar parcialmente os motores. Os motores 4, 3 e 1 foram reativados com sucesso, mas o motor número 2 voltou a falhar e teve de ser desligado novamente. Apesar disso, e com a visibilidade através do para-brisa severamente comprometida pelas partículas de cinza, a tripulação conseguiu manter a aeronave estável e realizar um pouso seguro no Aeroporto Internacional Halim Perdanakusuma.
Investigação e Causas
A investigação posterior revelou que a falha dos motores foi causada pela ingestão de cinzas vulcânicas. As finas partículas derreteram nas câmaras de combustão e aderiram às pás das turbinas, formando uma camada vítrea que bloqueou o fluxo de ar e extinguiu a chama, causando a parada dos motores.
A reinicialização só foi possível porque, à medida que o avião descia, o ar mais frio fez com que o vidro solidificado se tornasse quebradiço e se partisse, permitindo que o ar fluísse novamente.
Além disso, a cinza danificou os para-brisas e as tampas das luzes de pouso, e também obstruiu os tubos de Pitot, resultando em leituras de velocidade aérea não confiáveis. A aeronave não detectou a nuvem de cinzas nos radares meteorológicos, que são projetados para identificar umidade, não partículas secas e finas.
O evento destacou a necessidade de protocolos mais rigorosos para monitoramento de atividades vulcânicas e seus impactos na aviação. Como resultado, foram implementados os Centros de Aviso de Cinzas Vulcânicas (VAACs) para melhorar a segurança aérea em áreas propensas a erupções.
Legado
O capitão Eric Moody e sua equipe receberam diversos reconhecimentos por sua habilidade e compostura, incluindo a Queen’s Commendation for Valuable Service in the Air. O episódio também foi retratado no documentário Mayday: Desastres Aéreos, que detalha o incidente e os esforços da tripulação para salvar o voo.
O voo British Airways 9 ficou marcado na história da aviação como um exemplo de liderança calma e eficaz em situações extremas, ressaltando a importância da preparação, da experiência da tripulação e do Gerenciamento de Recursos da Tripulação (CRM) na gestão de emergências aéreas.