A guerra comercial entre EUA e China atingiu novo patamar nesta semana. Donald Trump iniciou o conflito com tarifas de 84% sobre produtos chineses. A China retaliou com medida equivalente, levando os EUA a elevarem as taxas para 104% – movimento novamente espelhado pelo governo chinês. Irritado com a reciprocidade, Trump aumentou as tarifas para 124%, e após nova resposta chinesa, os EUA fixaram a sobretaxa em 145%, encerrando (por ora) a rodada de retaliações.
Efeitos Imediatos nos Mercados
A turbulência derrubou bolsas globais, com exceção de Xangai, que fechou em alta. O dólar se valorizou, refletindo a aversão ao risco. Para entender os impactos no Brasil, conversamos com o Dr. Allison Manoel de Sousa (UFPA), especialista em contabilidade e finanças.
Até onde pode ir essa guerra comercial?
Em relação à guerra comercial travada pelos EUA por meio de tarifas relacionadas a produtos importados de outros países e que gerou retaliações de outros países ao aumentarem as taxas de importação de produtos estadunidenses, tende a provocar aumento significativo da incerteza quanto ao fluxo de capital alocado em forma de investimentos.
A guerra comercial, no curto e médio prazo, pode fazer com que as economias envolvidas sofram prejuízos substanciais, o que poderia levar a desaceleração da economia e, consequentemente, intensificação da incerteza econômica e aumento da pressão interna em cada país.
Apesar disso, acredito que ainda é cedo para saber todos os desencadeamentos proporcionados pela guerra comercial, pois muitos países ainda estão buscando negociações quanto à taxa das tarifas e avaliando possíveis soluções que objetivam mitigar as consequências negativas de uma guerra comercial.

Quais os impactos dessa guerra na economia internacional?
Em um mundo globalizado e altamente conectado quanto às cadeias de suprimentos de produtos que envolvem economias de diversos países, uma guerra comercial tende a não ser positiva para a economia global. Quando uma guerra comercial ocorre, faz com que o aumento da incerteza econômica aumente e faça com que os agentes econômicos fiquem mais receosos no tocante à alocação de recursos financeiros em forma de investimentos, principalmente em outros países. Isso faz com que haja redução na geração de novos empregos, além de reverberar na desaceleração no Produto Interno Bruto (PIB). Além disso, as cadeias globais de suprimentos também tendem a ser afetadas com o encarecimento de produtos, o que pode corroer o poder de compra da população e contribuir para o aumento de índices inflacionários. Assim, como já sabemos, provocando consequências negativas à população, principalmente para as pessoas mais pobres que são as mais afetadas com aumento da inflação.
Essa jogada do Trump é racional?
O aumento de tarifas de produtos importados de outros países pelos EUA foi uma das propostas que alicerçaram a campanha de Donald Trump. O aumento de tarifas de produtos de países outros é uma forma, de o governo dos EUA sinalizar à sua base eleitoral, que estão implementando mecanismos que buscam proteger empregos, principalmente em setores industriais.
No entanto, no médio e longo prazo, tende a encarecer os custos envolvidos na cadeia produtiva, inclusive de produtos produzidos e comercializados em território estadunidense. Dessa forma, a continuidade da guerra comercial no médio e longo prazo pode ter como consequências o aumento de índices inflacionários, inclusive nos EUA, e atingir negativamente o poder de renda do americano médio, que é a base eleitoral principal do governo Trump.
Além disso, o aumento das tarifas de forma recíproca de outros países pode levar a perda do nível de competitividade das empresas americanas. Por fim, a guerra comercial também pode enfraquecer a confiança de outros países em firmar acordos bilaterais de longo prazo com os EUA.

Quais os impactos o Brasil pode sofrer?
A guerra comercial tende a afetar a todos os países, inclusive o Brasil. De maneira geral, o Brasil pode ser afetado negativamente em função da tendência de desaceleração da economia global que, por sua vez, pode mitigar o crescimento do PIB brasileiro.
o cenário das exportações, o Brasil também pode se aproveitar do cenário global de incerteza e acirramento da guerra tarifária, principalmente entre os EUA e a China, para aumentar o volume de produtos do agronegócio – principalmente milho, soja e carnes – à China.
Por outro lado, o alto número de produtos produzidos pela China e países asiáticos outros podem ficar mais presentes no Brasil em função de perderem competitividade nos EUA, o que pode impactar a indústria brasileira.
O Brasil pode se aproveitar dessa situação?
O Brasil pode fazer da guerra comercial como uma forma de aumentar a exportação de commodities e atração de investimentos de países que buscam fugir das tensões entre EUA e China.
No âmbito das exportações, o Brasil pode ter benefícios em setores de commodities ligadas aos agronegócios, principalmente no que concerne à exportação de soja, milho e carnes. Esses benefícios tendem a ocorrer porque o principal concorrente dos produtos brasileiros são os produtos dos EUA.
essa forma, haveria uma oportunidade para o Brasil intensificar as exportações em função da guerra comercial reduzir a procura de commodities dos EUA pela China. No tocante à atração de investimentos, o Brasil pode se portar como um país que não está envolto ao cerne da guerra comercial e atrair investimentos de empresas que buscam fugir das tensões entre os EUA e China.
O Brasil também pode se portar como um país diferenciado quanto à atração de investimentos por manter boas relações em diversos países, inclusive com ambos os lados protagonistas na guerra comercial. Assim, o Brasil pode se aproveitar da guerra comercial como uma oportunidade de ampliar o superavit da balança comercial e atrair novos investimentos que geram empregos em seu território.

Como essa guerra impacta na vida das pessoas comuns?
A guerra comercial tende a impactar a vida das pessoas comuns, principalmente em função de implicar no aumento do nível de incerteza e aumentar os custos das cadeias de suprimentos. Esses desencadeamentos da guerra comercial fazem com que os investimentos sejam postergados, o que prolonga a geração de empregos para o futuro.
Tarifas adicionais em produtos importados tornam os custos das cadeias de suprimentos mais altos e faz com que os produtos tenham aumento de preço, contribuindo para o aumento da inflação. Em função disso, as pessoas comuns são impactadas com níveis de inflação mais altos que corroem mais rapidamente o poder de compra da população. Devido à renda diversa entre os indivíduos de uma população, as pessoas mais pobres são as mais prejudicadas porque tem redução no poder de compra de produtos de forma mais acentuada.
Assim, embora a guerra comercial pareça ser um fenômeno distante de todos nós, é um evento que gera consequência na vida das pessoas comuns, desde os que possuem maior poder aquisitivo, mas principalmente as pessoas mais pobres.