Dez anos após sua criação, Lei Brasileira de Inclusão ainda necessita de aperfeiçoamentos

Talita Delfino projeta um futuro em que as pessoas com deficiência possam viver numa sociedade que não deixe morrer, não faça morrer, mas deixe viver

Compartilhe

Dez anos após sua criação, os direitos das PCDs seguem em disputa, com riscos constantes de retrocessos em áreas como saúde e acesso à Justiça – Ilustração: redgreystock/Freepik

Uma década após a criação da Lei Brasileira de Inclusão (LBI), pessoas com deficiência (PCDs) ainda enfrentam barreiras no acesso à saúde sexual, educação e representatividade. A falta de equipamentos adaptados e a invisibilidade social perpetuam estigmas e violências, revelando um longo caminho para a efetiva inclusão. A pesquisadora Talita Delfino, da Faculdade de Educação (FE) da USP e pessoa com deficiência, explica: “Enquanto pessoa com deficiência física, as barreiras que são impeditivas para a minha participação podem não ser as mesmas das pessoas com outros tipos de deficiência. São pessoas que possuem corpos, que possuem desejos, que têm características diferentes, personalidade diferente, desejos diferentes”.

Mulher branca, jovem cabelos escuros e compridos, usando óculos e sorrindo para a câmera
Talita Delfino – Foto: Linkedin

A acessibilidade em serviços de saúde ainda é um desafio crítico. Mamógrafos e marcas ginecológicas não são adaptados para cadeirantes ou pessoas com baixa estatura, dificultando a prevenção de doenças como o câncer de mama. Além disso, muitos dependem da ajuda de terceiros, sejam familiares ou profissionais de saúde, para realizar exames básicos, o que aumenta a vulnerabilidade.

O imaginário de que PCDs não têm desejos ou vivem em uma “eterna infância” resulta na exclusão de campanhas de prevenção a ISTs (Infecções Sexualmente Transmissíveis), materiais em braile e discussões sobre violência sexual. “As campanhas de prevenção de IST não possuem pessoas com deficiência, as informações não estão acessíveis, os materiais de divulgação nunca viram braile, é como se as pessoas com deficiência não precisassem de acesso a essas informações, o que é um problema, porque se eu acho que pessoas com deficiência não têm vida sexual, eu não imagino que essas pessoas possam passar por violência sexual.”

A pesquisadora relata que os casos de abuso sexual contra mulheres, crianças e adolescentes com deficiência atingem números alarmantes, com a maioria ocorrendo no âmbito familiar. Outro problema frequente, segundo ela, é a permanência em relacionamentos abusivos, muitas vezes motivada pela crença internalizada de que ninguém amará você além do agressor. Essa situação se agrava pela dificuldade da sociedade em reconhecer que cuidadores ou companheiros podem ser os próprios agressores, criando um ciclo de violência difícil de romper.

Plenos direitos

Apesar dos progressos em educação e inclusão social, a LBI ainda não garantiu plenos direitos. Dez anos após sua criação, os direitos das PCDs seguem em disputa, com riscos constantes de retrocessos em áreas como saúde e acesso à Justiça.

Talita conta: “Nós tivemos muitos avanços, na educação, saúde, a inclusão social, mas a gente ainda tem muito para caminhar e o mais importante é o campo de disputa dos direitos das pessoas com deficiência, que é continuamente atacado, ele está em constante disputa. Então, a todo momento, as pessoas com deficiência e seus aliados estão disputando ali os jogos de poder com instituições que se dizem filantrópicas e que se dizem preocupadas com o cuidado e com a garantia dos direitos, quando, na verdade, estão ali querendo um lobby para ganhar em cima de terapias que se dizem comprovadas cientificamente”.

“A maior dificuldade é o capacitismo, a falta de empatia, de voz, de oportunidade”, destaca. A invisibilidade persiste, desde figuras históricas que tiveram suas deficiências apagadas até a ausência de PCDs em debates públicos. “Precisamos ser vistos como pessoas antes de qualquer outra característica.”

O caminho, segundo a pesquisadora, exige ação coletiva: “A gente precisa lutar por uma sociedade melhor, por um futuro melhor para todos nós. Principalmente para as gerações que estão vindo e com muito mais força do que a nossa. Então, a gente precisa resistir e viver por um futuro antirracista, anticapacitista, antimachista, anti-homofóbico, antitransfóbico, por um futuro que seja para todo mundo, que todo mundo possa viver e não apenas sobreviver. Que, acima de tudo, a gente possa viver numa sociedade que não deixe morrer e não faça morrer”.

*Com Jornal da USP – Bernardo Carabolante sob supervisão de Paulo Capuzzo

Recentes
Caso Epstein volta ao noticiário com troca de acusações entre Elon Musk e Donald Trump
Caso Epstein volta ao noticiário com troca de acusações entre Elon Musk e Donald Trump
Mundo · 7h
Microalga remove resquícios de antibióticos da água, diminuindo contaminação do meio ambiente
Microalga remove resquícios de antibióticos da água, diminuindo contaminação do meio ambiente
Brasil · 16h
3 animações da Disney com temática medieval que pouca gente conhece
3 animações da Disney com temática medieval que pouca gente conhece
Cultura · 17h
Pesquisadores criam tecnologia para melhorar dispositivos eletrônicos
Pesquisadores criam tecnologia para melhorar dispositivos eletrônicos
Ciência · 18h
Mais do PortalGO
Foto: Ryuno / Unsplash
SAF: o combustível sustentável que promete revolucionar a aviação
Combustível sustentável feito de resíduos como óleo de cozinha, é a principal aposta para diminuir emissões de carbono da aviação e tornar o setor mais verde. 06 jun 2025 · Tecnologia
© TV Brasil
Crianças pequenas são mais expostas a riscos climáticos, mostra estudo
Primeira infância no Brasil é a mais vulnerável à crise climática, revela estudo do NCPI e Fiocruz divulgado nesta quinta (5). 06 jun 2025 · Meio Ambiente
Foto: Lucas Caetano
Cinema, música e tradição tomam conta de Goiânia na primeira semana de junho
Goiânia recebe eventos culturais gratuitos em junho com cinema, música e festas juninas para todos os públicos. 06 jun 2025 · Cultura
Foto: PortalGO
PortalGO inaugura podcast “Quem Vai Ganhar?”: primeira entrevistada é Ana Paula Rezende
Filha de Iris, Ana Paula Rezende fala sobre legado político, memorial dos pais e possibilidade de candidatura no podcast “Quem Vai Ganhar?”. 05 jun 2025 · Política
Foto: @rafaelribeirorio I CBF
Brasil enfrenta Equador na estreia do italiano Carlo Ancelotti
Começa a era Ancelotti! Brasil encara Equador pelas Eliminatórias da Copa, nesta quinta (5), às 20h. Veja possível escalação. 05 jun 2025 · Esportes
Foto: Ricardo Stuckert / PR
Lula pede que Macron “abra seu coração” para acordo com Mercosul
Lula a Macron: ‘Não sairei da presidência do Mercosul sem acordo com UE’. Apelo feito em Paris com críticas ao protecionismo. 05 jun 2025 · Mundo
"Saneamento Básico, o Filme" (2007), dirigido por Jorge Furtado e protagonizado por Wagner Moura, Camila Pitanga e Lázaro Ramos poderá ser revisitado pelo público – Foto: Divulgação
Três estreias movimentam programação do Cine Cultura
Cine Cultura traz estreias e clássicos: Oh, Canadá, Memórias de um Caracol, Ilha das Flores e mais. Confira a programação de 5 a 11 de junho! 05 jun 2025 · Cultura
Foto: Daniel Fucs – Wikimedia
Aberta a temporada de quermesses em Goiânia
7 quermesses juninas em Goiânia: de pamonha a quadrilha! Datas, locais e preços. Paróquias com entrada gratuita e programação especial. 05 jun 2025 · Cultura
Divulgação – TJRJ
MP do Rio recorre de decisão que mandou soltar Vitor Belarmino
MPRJ recorre contra soltura de influenciador que atropelou noivo no dia do casamento. Belarmino dirigia a 109km/h e fugiu sem socorrer. 05 jun 2025 · Justiça
© Agência Brasil/Arquivo
Finep, Petrobras e BNDE lançam fundo para transição energética
Petrobras investe R$250 mi em fundo para descarbonização. Startups com soluções validadas em energias limpas podem receber investimentos. 05 jun 2025 · Meio Ambiente